Cuidado com os fogos de Artifícios

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Tempo de matar cavalos

Crédito: arte Pedro Dreher sobre fotos cp memória

Meu avô era um sábio analfabeto. Certas coisas ele não compreendia: as mulheres que via na televisão bronzeando-se ao sol do meio-dia e homens cansando cavalos inutilmente.
Antes de os cientistas darem o alerta ele já conhecia os perigos do sol para a pele dos humanos e para o fôlegos dos animais.
Meu pai seguia a mesma lei: no verão, não se encilhava cavalo das 11 horas da manhã até quatro e meia da tarde. Salvo extrema necessidade. Por isso, levantavam muito cedo.
As principais lides campeiras tinham de ser feitas antes de o sol ganhar o alto do céu. Andar a cavalo sem necessidade no calor era para eles coisa de gente da cidade. Pior do que isso, era algo condenável. Bárbaro.
As notícias de que dois cavalos morreram na tal cavalgada do mar horrorizariam meu avô e meu pai.
Eles adoravam cavalos. Cuidavam deles com muito carinho. Veriam nessa exibição de cavaleiros urbanos, num dos verões mais quentes dos últimos tempos, um exibicionismo despropositado, uma falta de conhecimento escandalosa e uma maldade intolerável com os bichos.
Para quê? Mais espantoso é o lema da brincadeira deste ano: "mulheres a cavalo pelo Rio Grande".
Um gaúcho verdadeiro, da campanha, diria com algum deboche: parem com isso, soltem os cavalos pelo Rio Grande.
Com um solaço desses só há uma coisa a fazer: ficar mateando ou sesteando embaixo de um cinamomo. O resto é frescura de gente maturranga.
A secretária da Cultura, Mônica Leal, está contribuindo para maltratar cavalos na beira do mar.
 Ela é entusiasta desse tipo de ação cultural. Enquanto ela ajuda a estafar cavalos, sentindo-se uma nova Anita, a cultura do Rio Grande do Sul estrebucha.
A sala de cinema Norberto Lubisco foi fechada. Tem cinema no shopping. Voltaire Schilling, um dos nossos intelectuais mais brilhantes e tradicionais, foi demitido da direção do Memorial do Rio Grande do Sul. Parece que ele não tinha o que conversar com a chefe.
Afinal, não é de andar a cavalo na praia com sol quente.
A casa está caindo, os cavalos morrendo, o circo pegando fogo.
 Mas a secretária Mônica Leal está firme na montaria. Sempre. Ela é dura na queda. Corresponde a todos os clichês imagináveis.
Agora, entre nós, há sem dúvida um ponto obscuro, um elemento que exige investigação séria: por que mesmo Mônica Leal tornou-se secretária da Cultura?
É um tempo estranho este. Quando não há mais necessidade alguma de movimento, todos querem se deslocar.
Especialmente pelos meios mais anacrônicos.
Pode haver algo mais excitante do que permanecer no lombo de um cavalo, com o sol a pino, até o bicho morrer?
Tudo isso em nome da tradição!
Os franceses do século XVIII usavam perucas empoadas. O Ministério da Cultura da França devia lutar pela recuperação dessa tradição eliminada pela modernidade.
Vou comprar um cavalo para matar na próxima cavalgada.

Juremir Machado da Silva
Porto Alegre, quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010.

Um comentário:

  1. Crioulo de guerra e fé
    pra ti, o rio grande é pequeno
    e se pensando te enfreno,
    Como irmão, não como escravo,
    em pensamento te lavo
    com bochechos de sereno

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"Não comer carne significa muito mais para mim que uma simples defesa do meu organismo; é um gesto simbólico da minha vontade de viver em harmonia com a natureza. O homem precisa de um novo tipo de relação com a natureza, uma relação que seja de integração em vez de domínio, uma relação de pertencer a ela em vez de possuí-la. Não comer carne simboliza respeito à vida universal." Pierre Weil
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